Ricardo I (1157-1199), terceiro filho de Henrique II, rei da Inglaterra, recebeu aos onze anos o ducado de Aquitânia, na França, do qual tomou posse em 1169, mas a partir de 1173 a 1188, manteve-se constantemente em guerra, ou aliado aos irmãos contra o pai, ou contra os seus próprios irmãos. Com a morte destes tornou-se herdeiro dos tronos da Inglaterra e Normandia, tendo sucedido a seu pai em setembro de 1189.
Em princípios de 1191 ele atendeu ao apelo papal e aliou-se a Filipe Augusto, rei da França, organizando um exército de 8.800 homens com os quais embarcou em cem navios com destino a uma cruzada (a terceira) visando retomar Jerusalém. No caminho conquistou Chipre, e em seguida colaborou para a queda de Acre, cidade fortificada e porto de mar que desde 1187 estava em poder de Saladino, sultão do Egito e da Síria.
Ricardo o derrotou num segundo combate, e por duas vezes avançou até os muros de Jerusalém, mas desentendimentos entre os próprios cruzados, que culminaram com a saída do exército de Filipe Augusto da campanha, além das más notícias chegadas da Europa, dando conta que seu irmão havia se apossado do trono com a ajuda do rei francês, fizeram-no assinar em 1192 um tratado de paz com o príncipe oriental, segundo o qual os cristãos ficavam com as cidades costeiras da região e o direito de visitar o Santo Sepulcro.
Retornando à Inglaterra, seu navio naufragou no mar Adriático em dezembro de 1192, mas ele conseguiu salvar-se. Para evitar a entrada em território francês Ricardo tentou atravessar a Alemanha sob disfarce, porém foi reconhecido, preso, levado a Viena e entregue ao imperador daquele país, com o qual negociou um resgate no valor de 150.000 marcos para recuperar a liberdade. Solto em março de 1194, chegou no mesmo mês à Inglaterra, entrando em Londres sob aclamação popular.
Depois de derrotar João sem Terra, que havia se apossado do trono, foi coroado novamente como rei dos ingleses, e então, reunindo o dinheiro que pôde, preparou suas forças para combater na Normandia a Filipe Augusto, cúmplice do irmão usurpador, mas após quase cinco anos de lutas assinou com ele, em janeiro de 1199, um tratado de paz.
Cerca de três meses depois, ao disputar com o visconde de Limoges um tesouro encontrado no castelo de Chaluz, foi atingido por uma flecha no ombro. O ferimento gangrenou, e ao perceber que sua sorte estava selada Ricardo proclamou o irmão João como herdeiro, decretando o perdão para o arqueiro que o alvejara. Dos dez anos de seu reinado, o rei também conhecido como Coração de Leão pela bravura e desassombro demonstrado em suas ações, conseguiu viver apenas alguns poucos meses em seu país.
Uma das passagens mais significativas, mas também pouco conhecida, da vida de Ricardo Coração de Leão, aconteceu na batalha do Acre, durante a Terceira Cruzada, convocada pelo para Gregório VII para libertar Jerusalém das mãos dos muçulmanos. Situada na região da Galiléia, num promontório ao norte da Baía de Haifa, na costa do Mediterrâneo, a cidade é um porto histórico rodeado por muralhas e povoada desde o tempo dos fenícios (a parte antiga da cidade é considerada patrimônio da humanidade pela ONU).
Em 1110 a cidade foi invadida pelos cruzados, sendo reconquistada por Saladino em 1187. Quatro anos depois (1191) quando avançava para Jerusalém, Ricardo Coração de Leão retomou a sua posse e domínio após um cerco que durou trinta dias, tendo nessa ocasião aprisionado cerca de 3.000 combatentes inimigos. Segundo consta, uma vez terminada a batalha, o soberano inglês propôs a Saladino a libertação dos prisioneiros mediante o pagamento da importância de 200 mil dinares, tendo o comandante árabe apresentado uma contra-proposta: o dinheiro seria entregue em duas prestações, mas a libertação da maioria dos aprisionados precisaria ser feita tão logo a primeira parcela fosse satisfeita. Ricardo não gostou do que ouviu, e por isso ordenou a morte dos 3.000 prisioneiros, o que foi feito em campo aberto, defronte à cidade e bem em frente das tropas de Saladino.
Para justificar o seu ato Ricardo alegou que não teria como alimentar os três mil prisioneiros, e além do mais, caso os libertasse, eles retornariam às suas tropas e voltariam a lutar contra ele. Por isso o soberano optou pela ordem de execução, medida extrema curiosamente repetida seiscentos anos depois por Napoleão Bonaparte, que em 1799, quando avançava em direção ao Egito, fez 4,000 prisioneiros na mesma cidade de Acre, e não podendo alimentá-los, também autorizou o massacre de todos os prisioneiros.
Em revide à atitude de Ricardo, Saladino, determinou que qualquer cristão aprisionado deveria ser morto imediatamente, medida que não era nenhuma novidade porque já havia sido praticada por ele anteriormente: na batalha de Hattin, travada quatro anos antes, todos os Templários e Hospitalários aprisionados pelos muçulmanos foram decapitados.
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