Se os núcleos dos átomos são constituídos por partículas positivas (os prótons), e partículas neutras (os nêutrons), como eles se mantêm coesos, se não há duas forças opostas garantindo a atração das partes? Essa pergunta foi respondida em 1946, com a descoberta de uma partícula subatômica chamada mesom-pi.
O cientista brasileiro César Lattes teve papel decisivo nessa experiência. Mais do que emprestar seu nome à Plataforma Lattes, que armazena dados de pesquisadores e instituições do C & T do país, ele foi responsável por colocar o Brasil na rota mundial das pesquisas em Física.
Cesare Mansueto Giulio Lattes nasceu em Curitiba, Paraná no dia 11 de junho de 1924. Filho de imigrantes italianos que vieram para o Brasil em 1921, César, como preferiu se apresentar pelo fato de as pessoas não pronunciarem seu nome corretamente, cursou o ensino primário e fundamental na Escola Americana, de 1929 a 1933, e o ensino médio no Instituto Dante Alighieri, em São Paulo, entre 1934 e 1938. Possuidor de grande habilidade na área de exatas, optou pela carreira de professor e ingressou, em 1939, na graduação de Física da Universidade de São Paulo (USP).
O cientista que ganhou fama internacional com a descoberta da subpartícula meson-pi, começou a surgir em 1943. Nesse ano, ele travou contato com Gleb Wataghin, um dos principais físicos do período. O primeiro artigo científico realizado por Lattes foi feito sob a orientação de Wataghin, abordando a grande quantidade de núcleos do universo. Após a formatura, atuou como professor de física teórica e, em seguida, passou a dedicar-se à física experimental, especialmente ao estudo de raios cósmicos.
Desenvolveu pesquisas na USP de 1944 a 1946, quando teve aprovada sua candidatura para trabalhar na Universidade de Bristol, na Inglaterra, onde o físico italiano Giuseppe Occhialini, seu conhecido, investigava a existência de partículas subatômicas sob a coordenação do cientista inglês Cecil Powell.
O procedimento de pesquisa utilizado pelos físicos de Bristol era a exposição ao ar livre de placas fotográficas, contendo um composto químico feito a partir do boro, que registrava a trajetória das subpartículas nucleares. Essas partículas eram bombardeadas pela irradiação solar, e as marcas deixadas por sua destruição constituíam a prova de sua existência.
Ao conhecer o método Lattes sugeriu que as chapas fossem expostas em locais de grande altitude, onde teriam mais chances de serem atingidas por raios. As descargas atmosféricas garantiriam resultados mais rápidos e confiáveis, pois a grande energia permitia que os traços que indicavam a presença das subpartículas fossem mais facilmente percebidos. O local adequado para a realização da experiência também foi sugerido pelo físico brasileiro, que propôs levar as placas à parte dos Andes situada na Bolívia, a 5.500 metros de altitude. Lá, o material foi deixado por um mês. Quando foram recolhidas, as placas mostravam rastros que sugeriam a existência das partículas nos núcleos atômicos.
Lattes analisou o resultado obtido e não apenas confirmou a presença do meson-pi, como também constatou que ele se transformava em duas outras subpartículas o múon, que possui carga negativa, e outra com carga neutra cujos rastros não podiam ser gravados nas placas. Assim que retornou à Inglaterra Lattes comunicou o resultado a Cecil Powell. Apesar da contestação de alguns cientistas, a descoberta, que contou com o apoio do físico Niels Bohr, acabou sendo acolhida pela comunidade científica.
Existe uma grande polêmica envolvendo Lattes, ligada à edição do Nobel de Física de 1950. Nesse ano, Powell recebeu o prêmio por descobertas relacionadas aos mésons e por criar um método ortográfico para estudo de processos nucleares. Muitos indagam a razão de o brasileiro não ter recebido a premiação, já que teve papel decisivo no feito, ou por que ela não foi concedida à equipe que trabalhava com o professor inglês.
Há quem defenda que a nacionalidade foi fator preponderante para a predileção da banca examinadora, composta por ingleses. Lattes, no entanto, discordava. Em entrevista à revista “Superinteressante”, a última dada antes de falecer em decorrência de um infarto, em 8 de março de 2005, o físico afirmou que o prêmio deveria ter sido entregue a seu colega Occhialini. “Tanto na descoberta do meson-pi, em 1945, como na sua criação artificial, em 1948, tive a colaboração de Giuseppe Occhialini. Quem deveria ter ganhado era ele”.
Mas para o maior físico da história do Brasil, isso não importava. “Esses prêmios grandiosos não ajudam a ciência”, acreditava.
Fonte: Minas faz Ciência – março a maio de 2008
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